ROSALÍA: A Profeta | Profissão Mãe

10 de novembro de 2025

Existem poucos artistas capazes de me fazer mergulhar durante alguns dias no esoterismo, na teologia e na espiritualidade. A cinematografia, o enredo, o uso das cores, a sua voz, as mensagens escondidas e a orquestra? Na era da inteligência artificial, para uma cantora que se assume como fazendo música pop, ela fez mais que isso e fê-lo com mestria.

Mas, voltando a Rosalía, a profeta: que num só álbum é capaz de nos oferecer tanto, poucas são as pessoas que se interessam pelo que vou dizer (mas também é isso que o álbum nos convida a refletir: esquecer o que os outros dizem sobre nós e para não perdermos o nosso próprio foco). Para as que, tal como eu, se interessam por estes assuntos… destaco uma música em particular que é simplesmente magistral!

                             ROSALÍA - Berghain (Official Video) feat. Björk & Yves Tumor


A canção Berghain com pequenos traços de barroco meio-dramático é inspirada em Hildegarda (Hildegarda de Bingen: abadessa beneditina do séc. XII, Alemanha do Reno; mística cristã cujas visões foram aprovadas pela Igreja; compositora do "drama sagrado" Ordo Virtutum, onde as Virtudes cantam e o Demónio apenas fala, como podem ouvir no final "falado" de “Berghain” através da voz de Yves Tumor), tem também um pouco de Alquimia, obviamente, esta parte já é a minha leitura pessoal simbólica: o nigredo (ferida, o peso e a confusão), calcinatio (açúcar que derrete, ela dilui-se), albedo (o branco na "branca de neve e na pomba), rubedo (o ouro no coração da joia): o coração-joia de “ouro” ferido → levado à ourivesaria e “sem cura” no mundo; existe quase uma parte eucarística, um mantra em alemão, uma quase vontade de abandonar tudo e fundir-se com ELE “o sangue dele é meu”, como pacto/aliança; as batidas como pulsação a; pomba final como transmutação e ascensão), e um pouco de arte (a referência visual é a “Dama com Arminho”, de Leonardo da Vinci, símbolo de pureza/moderação posso, obviamente, estar a navegar na maionese…). Ahahahahaha

Voltando um bocadinho atrás, atrevo-me a dizer que ela tenta reescrever o Ordo Virtutum da vida moderna: a Björk surge como uma ave, mas não é uma ave qualquer, é um pisco (mensageiro, “intervenção divina”); e Rosalía, a profeta, como uma Branca de Neve moderna, que está cansada das rotinas e das diversas vezes em que o seu coração se quebra! E o cervo, sim, o cervo, esse animal que, em muitas tradições, é um símbolo de renascimento (nos celtas, Cernunnos; no cristianismo, São Huberto/São Eustáquio). No conto da Branca de Neve, é o coração do cervo que substitui o da heroína; aqui, o coração-joia carrega o sacrifício e, no fim, as batidas que nos cortam a respiração, com imagens de um cervo em sofrimento… dão depois lugar ao voo de uma pombaascensão, transmutação em luz. 
Ela vai renascer, não morreu... como podemos ver nas músicas seguintes! 

É mais do que música, é uma obra de arte sublime! Estou completamente obcecada com isto!

Também tenho outra leitura, ser a voz de muitas mulheres!

A ferida que nos quebra, nos deixa em desanimo; a visão (sempre por uma intuição forte ou um sinal); a prova quando o mundo nos testa (acreditamos ou continuamos a fazer de conta?); a voz que transforma as visões em palavras (Hildegarda cantou; Vimala* silenciou-se sob a árvore). Vimala* foi uma célebre cortesã que depois escolheu ser monja-poeta budista na Therīgāthā, que vai influenciar Rosalía a encarnar a passagem do desejo alheio para a liberdade interior onde o desapego transforma o corpo outrora uma vitrine num templo.
O corpo deixa de ser a casa da mãe Joana, percebem? Uma ‘vitrine’ mundana, do devias ser assim ou assado, se fizesses isso eras mais bonita e todos vão gostar mais de ti, para passar a ser um templo, um altar para nós. Vem o serviço: a visão passa a curar algo.
E, no final, a memória, o perdão sobre nós próprias e quiçá um legado, para quem vier atrás encontrar um caminho aberto.

É este o legado que Rosalía, a profeta, nos deixa com este álbum: o convite ao som interior.


Já conhecias a Rosalía? Qual é a tua música favorita?

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